quarta-feira, 27 de março de 2013

¡Buenas tardes!, por Rita de Cassia Scocca Luckner


A sala estava quente, abafada e ruidosa.

A professora, suando, observava os alunos falarem, sem parar, uns com os outros, sem nem se darem ao trabalho de olhar para ela que entrou e disse: ¡Buenas tardes!

Desde as 7:30 da manhã que ela estava no colégio, entrando de sala em sala e a cada aula sempre o mesmo, tentar controlar os alunos que teimavam em sair do lugar para conversar ou provocar um colega.

Eram 5 horas da tarde e ela estava em sua última aula do dia, aula de espanhol. Restavam apenas 30 minutos para o término e ela ainda não havia conseguido a atenção dos alunos, então tudo começou a passar como em câmera lenta.

Ela via os movimentos incessantes das pequenas bocas, as conversas se misturavam e se perdiam sem sentido.

Chegou a chamar-lhes a atenção algumas vezes sem resultado, e encostada na parede ao lado do quadro negro, olhava-os pensando em todos os anos de estudo e dedicação para se graduar em três idiomas e depois passar por aquilo. Para que aprender? Para que estudar?

Aluno tem seu próprio mundo, onde as leis são feitas por ele e seus amigos da mesma idade, adulto não tem vez, adulto nem entra!

O cansaço acumulado de tantas cobranças por um trabalho impossível de se realizar como planejado a fez se sentir uma pessoa frustrada e pior, que ganhava um salário frustrante.

Tudo organizado e planejado desde o início do ano, menos a bagunça e o afrontamento dos alunos cujas atitudes são fortalecidas pelos mimos dos pais.

Houve um tempo em que professora era valorizada e respeitada por todos, pais, alunos, escola, sociedade.

O coração da professora começou a bater cada vez mais rápido, suas mãos tremiam, o suor que escorria no rosto, pescoço, no corpo todo estava frio, apesar do imenso calor que fazia na sala de aula.

Começou a respirar com dificuldade e sua visão tornou-se turva, mas mesmo assim, conseguiu reconhecer a porta localizada no meio da parede do fundo e que estava aberta.

Passando por ela e virando à esquerda, ela sabia que alcançaria o corredor que dava acesso à escada e de lá ao portão que dava para a rua.

Num afoitamento, a professora saiu correndo até chegar ao corredor no início da escada, onde foi surpreendida por um grupo de alunos que subia para a quadra. Restava a ela apenas um muro de 3 metros de altura no final da área descoberta.

Num impulso irracional, como um animal encurralado, ela escalou o muro, arrancando as unhas no cimento rústico e se jogou de lá de cima para o lado de fora da escola.

Caiu com as pernas para a rua e a cabeça na sarjeta. O sangue escorreu por todo o seu rosto, empapando o cabelo que estava grudado na testa pelo suor.
Estava imóvel com os olhos abertos, parecia que contemplava o céu com um estranho, mas largo, sorriso.


Fonte: LUCKNER, Rita de Cassia Scocca. Retalhos: pequenos contos e poemas. São Paulo: Editora SoMadi, 2013. 73 p.

Um comentário:

  1. Ao ler lembrei-me da dinâmica diária de ser professora.Mas ao término foi impossível não lembrar a música o Meu Guri de Chico Buarque. Parabéns

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